Difícil é falar da criação, principalmente tratando-se de uma obra tão grandiosa possuidora de distintas dimensões como é o caso de Vidas Secas, sob o enfoque da relação de poder e autoritarismo existente no seu enredo, bem como a relação com a realidade associada a ficção e o individuo reprimido psicologicamente pelo poder econômico, o status social e intelectual. Essa obra retrata com fidelidade a vida sofrida do nordestino vitimado pela seca e psicologicamente afetado pelo poder e pela indigencia. Uma obra do senhor Graciliano Ramos que é, sem dúvida, uma celebridade na literatura brasileira.
A literatura, na sua fenomenalidade é, pois um instrumento que dá vida aos vários gêneros, estéticas, estruturas e estilos que, por sua vez, dão ao criador a possibilidade de encantar o mundo através de sua arte.
As idéias aqui expostas não formam um todo acabado, pelo contrário, é apenas uma tentativa de refletir e propor novas formas de abordagem na exploração de uma obra grandiosa, como a que será aqui mencionada, através da análise dos personagens, numa perspectiva sócio-cultural e psico-social, como é o caso da relação de poder e autoritarismo e seus reflexos psíquicos no individuo na ficção em( Vidas Secas)e na realidade.
A maestria de Graciliano Ramos é singular no que diz respeito ao romance Vidas Secas, pois o autor é meticuloso e eloqüente quando traça com desenvoltura a realidade dos personagens, focaliza a hostilidade da natureza e os vários níveis de opressão do sistema rural arcaico fazendo uma ponte com a realidade do Nordeste brasileiro, que parecem impor ao homem a inferioridade social deste.
A fim de verificar a veracidade dessa hipótese, manipularam-se algumas perspectivas da relação de poder e autoritarismo bem como seus reflexos de repressão psicológicas aos quais são submetidos os personagens.
Serão aqui apresentados argumentos no que diz respeito à relação de poder e autoritarismo, desde as formas mais remotas, como a Igreja, os feudos, a escravidão, o nazismo de Hitler, a política entre outras, acabando por uma argumentação analítica a respeito de poder, autoritarismo e repressão psicológica em enfoque nos personagens de Vidas Secas.
O choque entre civilizações é um dos aspectos nucleares de Vidas Secas e aparece com destaque em alguns capítulos do relato, em “Cadeia”, “Festa”, “Contos” e “O Soldado Amarelo”. Fabiano é vitimado por sua ignorância, sofrendo as ações impiedosas do soldado amarelo, do cobrador de impostos e do patrão, o que deixa claro que, em alguns momentos, Fabiano está ciente de sua inferioridade cultural e social, portanto não é suficientemente esperto para alcançar a complexidade da vida urbana traçando em Fabiano um complexo de inferioridade que reflete em sua submissão por permitir que outros o tratem como um ser inferior. .
Enumerando as formas de poder que recaem sobre os personagens, podem ser citados: a sociedade em relação à família de Fabiano, o próprio Fabiano em relação à Sinhá Vitória e seus filhos, Sinhá em relação a Fabiano e seus filhos, a situação em relação às suas vidas, a religião, a ignorância e a falta de dinheiro em relação à situação de miséria a que são subjugados pela natureza , pelas autoridades e pela própria questão psíquica de sentir-se inferior aos outros pela falta de dinheiro,pela falta de estudo,,pelo status,e pela própria baixa-estima como ser humano.
Todos os fatos aqui mencionados estão diretamente relacionados à realidade atual do Nordeste brasileiro. Há necessidade de se tomar conhecimento da realidade política, econômica e social do Brasil de ontem, para que seja possível o entendimento do Brasil de hoje. Pode-se buscar essa compreensão através da literatura, já que esta faz parte de um fato real do dia a dia para transformar-se em ficção, transpondo a realidade para o plano da ficção, como nos diz GOLDMANN (1998):
(...) Sendo um romance durante toda a primeira parte da história, uma biografia e uma crônica social, sempre foi possível mostrar que a crônica social refletia, mais ou menos, a sociedade da época.
Vidas Secas é levadas pelo narrador a ser exatamente o que o seu título sugere em todos os aspectos e é justamente a interioridade de seus personagens o que dá vida e significado à obra.
Talvez a falta de informação e acesso a tudo a que um homem tem direito, seja o motivo para tanta passividade e desconhecimento do que podem e do que devem. A problematização, portanto, se dá no aspecto de poder e submissão dos personagens.
A obra Vidas Secas é narrada quase que completamente em pretérito, com a exploração acentuada do discurso indireto livre, o que dá maior veracidade à narrativa.
Além da veracidade, o discurso indireto livre, proporciona ao leitor uma maior intimidade com o texto já que o narrador faz livremente um aponte relacional entre leitor e texto. A interação proporcionada pelo discurso indireto livre permite o leitor partilhar pensamentos e sentimentos dos personagens através do discurso do narrador.
O texto escrito dessa forma permite ao leitor ,penetrar no universo psicológico do personagem e sentir sua fragilidade emocional.
“
“Entrava dia e saía dia. As noites cobriam a terra de chofre. A tampa anilada baixava, escurecia, quebrada apenas pelas vermelhidões do poente. Miudinhos perdidos no deserto queimado, os fugitivos agarraram-se, somaram as suas desgraças e seus pavores.”
(Graciliano Ramos, Vidas Secas – p.13)
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